II
MAS SERÁ ENTÃO MESMO VERDADE
QUE ELE ESTÁ AQUI PRESENTE?
A maior dificuldade que a razão humana encontra no acreditar que um fragmento de pão contenha o próprio Deus, o Infinito, o Imenso, é agravado por sacerdotes e fiéis que O tratam como se realmente Ele não estivesse lá. Ponho-me no lugar do ateu, do muçulmano, do judeu, do protestante e, entretanto nas igrejas católicas muitas vezes, vejo coisas, pessoas e comportamentos que me obrigam a interrogar-me continuamente se de fato Cristo estará realmente presente, como sempre acreditei.
Com efeito, grupos de visitadores, vestidos como muito bem lhes apetece, quero dizer, para além de todo o limite da decência e do pudor, passeiam livremente, como numa galeria ou exposição de arte, olham ou observam, curiosos e palradores, sem se dignarem sequer fazer qualquer gesto de respeito e de fé.
Tantas vezes, os próprios fiéis procuram apenas cômodos bancos para se sentar como numa sala de concertos... Não há genuflexórios que os levem a humilhar-se, a recolher-se, a adorar. O altar, praticamente despido, já não é o Seu trono, porque O desterraram para um sítio qualquer, como a um qualquer objeto, que nem sempre é assim tão fácil de descobrir. Por outro lado, tantas vezes as prescrições do Direito Canônico são apenas letra morta.
Tudo concorre para fazer, isso sim, que os próprios fiéis já nem queiram saber d’Ele: eles mesmos preferem ajoelhar-se diante de estátuas ou imagens, a ajoelhar-se diante do sacrário. Muitos não sabem sequer distinguir o que é a consagração e a benção; esta, se dada por qualquer exorcista de gritos, é logo preferida à celebração eucarística.
Muitos estão convencidos de que podem comungar, mesmo em pecado mortal, bastando um ato de contrição: a misericórdia de Deus supre tudo... A todos é licito a Eucaristia na mão, mesmo prevendo que os fragmentos, caídos por terra, possam ser pisados. “Que importa? Não há motivo para escrúpulos”: Deus adapta-Se a tudo...
Muitas vezes tenho ouvido repetir que Ele, ao instituir a Eucaristia, Se ofereceu como o pão das nossas mesas... Por conseguinte, disposto a ser tratado sem excessivas atenções... Precisamente como se, depois da consagração, esse pão se não tornasse ELE MESMO...
Já não há quase ninguém que não possa distribuir a Comunhão. A bispos, sacerdotes, diáconos, acólitos, leitores, religiosos, juntou-se agora um número indefinido de leigos, homens e mulheres. E todos, como certos eclesiásticos, vão declarando: estão autorizados a comungar por eles mesmos. Se a Missa é um mero banquete, e se à mesa não há hierarquias nem precedências, qualquer se pode servir por si só, sem depender de ninguém...
Alguns cânticos, acompanhados por certos instrumentos musicais, não fazem de modo algum qualquer apelo à presença de Deus, não convidam ao recolhimento, à súplica, a chorar as suas próprias culpas ou ao arrependimento... Judeus, Muçulmanos não poderão sequer suspeitar que nós acreditamos verdadeiramente na Sua Presença; e isto, sobretudo se ensurdecidos pelas contínuas palmas, se a ouvir o enjoado e indiscreto relato de experiências pessoais, se observam a cena nada séria de gente que se abraça, se beija e chega a dançar...
Muitos sacerdotes, no altar, parecem funcionários do culto, não ligando ao respeito pelas rubricas, mostrando-se expeditos ou desembaraçados, rotineiros, distraídos, enjoados ou aborrecidos... Preferem falar do social a falar de Deus; preocupam-se com recolher fundos para construções ou restaurações, organizar ou reger messes ou cantinas e acolher estrangeiros, copos de água, emigrantes, esquecendo tudo o mais, que é bem mais importante.
Antropologia, psicologia e sociologia interessam mais que a teologia: o amor do próximo parece que prevalece sobre o Amor de Deus e a Sua Justiça. Tenho visto irmãs que, uma vez recebida a Comunhão, logo desaparecem, ocupadas por uma infinidade de outras coisas, e descurando a única que é verdadeiramente necessária. Estão de tal modo despachadas e seguras de si, que se não dignam sequer fazer a genuflexão diante do Santíssimo... A sua confiança com Ele quase não tem limites; mas dá para nos interrogarmos se de fato ainda acreditam.
Eu, por mim, não tenho dúvidas. Se não fosse católico, o seu exemplo não me levaria a acreditar, como de fato escandaliza muitos fiéis que, desmoralizados, vão desertando das nossas igrejas.
Os Protestantes repetem-nos que, se estivéssemos convencidos da presença eucarística, não trataríamos o Senhor como todos o podem notar e deplorar ou lamentar.
continua......
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