O petismo só triunfa e tem triunfado porque seus advogados e procuradores na imprensa submetem a política ao que chamo “obscurantismo das luzes”. Como se querem monopolistas do “iluminismo” (gargalhadas!) e do “progressismo” (mais gargalhadas!), acham que não precisam responder por seus atos e por suas escolhas e pretendem censurar o debate na base do berro, interditando o confronto de idéias. O mais espantoso é que a reação dos petistas e de seus cupinchas do jornalismo é especialmente virulenta quando se atribui ao partido o que ele realmente pensa e faz. Notem que raramente gritam: “Isso é mentira!” Preferem o tom de denúncia: “Os reacionários estão nos perseguindo!” Peguemos dois temas que geram gritaria: a descriminação do aborto e as relações do partido com os narcoterroristas das Farc. Sobre o segundo, já escrevi bastante (o que não quer dizer que não possa fazê-lo de novo). Tratarei, neste texto, do primeiro.
O PT é favorável à legalização do aborto, de qualquer aborto? É! Foi uma decisão tomada no 3º Congresso do partido. E todos os seus membros, o que inclui a candidata do partido à Presidência, Dilma Rousseff, estão obrigados a seguir essa orientação e a lutar para torná-la uma realidade. E é o que o partido e ela própria vêm fazendo, temos de admitir (são coerentes!), embora, na boca da urna, tentem fingir que não. O Programa Nacional (Socialista) dos Direitos Humanos, que ganhou forma final da Casa Civil, então comandada por Dilma, incluiu a legalização do aborto como meta a ser atingida e, pasmem!, como um direito humano. A própria candidata concedeu entrevistas em que defendeu essa idéia. Na boca da urna, o discurso assumiu um tom ambíguo, mas que se destaque: até agora, Dilma não se disse contrária à legalização.
O PT está tão convicto da necessidade de descriminar qualquer aborto que chegou a PUNIR dois deputados que participaram de atos contra a legalização. Luiz Bassuma e Henrique Afonso tiveram seus direitos partidários suspensos por terem contrariado justamente as resoluções do 3º Congresso. Como as decisões tomadas são diretrizes partidárias, há que se concluir que, caso eleita presidente da República, Dilma vai tentar implementar o programa do partido e lutará, pois, para legalizar o aborto em qualquer caso. Posso achar, e acho, um horror, mas ela estará sendo coerente com o que pensa. Incoerente, aí sim, é um cristão — não é caso da candidata, que confessa rezar só quando o avião balança — escolher esse caminho.
Os petistas e aqueles setores da imprensa não querem debater o assunto agora. A própria oposição parece não considerá-lo muito confortável. Os que se manifestam contra a legalização do aborto são tratados pelo subjornalismo militante como expressões do atraso, e a questão é vista como parte de uma pauta “apenas religiosa”. APENAS?
Eu sou contra a existência de partidos religiosos — no mais das vezes, faz-se má política e se pratica péssima religião. Não gosto de coisas como “bancada evangélica” ou “bancada católica”. Vejo nisso uma tentativa infeliz de manipular a crença em favor de questões demasiadamente terrenas. Mas defendo, aí sim, o direito que a Igreja Católica — e qualquer outra igreja — tem de lembrar a seus fiéis quais são os princípios que reúne a sua comunidade. Não reconheço é o direito, o intelectual ao menos, que tem Edir Macedo de distorcer o Eclesiastes para defender tal prática, como ele faz. Não que eu me fie muito em seus valores religiosos. Trata-se apenas de mais uma particularidade do empresário.
Não dá para ser cristão e, ao mesmo tempo, ser favorável à legalização do aborto. Não dá porque são coisas antitéticas. Não se trata de um assunto ligado meramente à esfera dos costumes, que tende a mudar com o tempo. Trata-se de um princípio e de um fundamento moral do cristianismo. Ou bem se escolhe uma coisa ou bem se escolhe outra. Por isso mesmo, vejo com assombro o tal grupo “Católicas pelo Direito de Decidir”, que defende a descriminação do aborto. Ora, é claro que elas são livres para decidir deixar a Igreja. Mas não são livres, não, para, dizendo-se católicas, travar a sua luta. Ela é ncompatível com o fundamento da crença que dizem ter.
É simples assim. Ser católico é uma escolha, não uma imposição. Feita a escolha, há princípios. Não me venham com essa conversa de que os “reacionários” de sempre estão acusando Dilma ou o PT de serem favoráveis à legalização do aborto. Trata-se de fatos. Ela concedeu entrevistas defendendo esse ponto de vista. E essa é uma resolução do congresso do partido. Ou será, agora, reacionário atribuir ao PT o que o próprio PT defende?
Por: Reinaldo Azevedo – Revista VEJA
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