Fui visitar uma jovem vocacionada da Arquidiocese do Rio de Janeiro que se preparava para ingressar na vida religiosa, mas que se encontrava internada num hospital, por motivo de uma grave doença.
Após meses de grandes sofrimentos, no leito hospitalar, na presença do Bispo responsável pelo setor das vocações, Dom Karl Joseph Romer, ela realizou seu grande desejo de se consagrar a Deus em suas mãos, durante uma Santa Missa celebrada em seu quarto de hospital. Dias depois veio a falecer. Era o ano de 1981.
A mais velha dos 15 irmãos, dos quais 11 estão vivos, Ângela Maria Bravin, participante do 4º Retiro de “Discernimento Vocacional”, achava-se muito doente, desde setembro de l979. O último encontro de acompanhamento do qual participou foi em outubro, do mesmo ano, no Colégio Sion, Cosme Velho, Rio de Janeiro.
Ângela nos deixou neste 30 de dezembro, após 15 meses de terrível sofrimento, aceito de modo admirável, plenamente consciente de seu fim próximo.
Muitos de vocês a puderam visitar. Como dezenas de pessoas desfilavam, cada dia, diante de seu leito, o médico achou por bem restringir as visitas. Todos guardamos lembrança de sua total, alegre e confiante entrega nas mãos do Pai.
Ângela não realizou o seu ideal de vida religiosa, mas consagrou-se a Deus, no mês de novembro. Para esta grande festa, início de nova caminhada em sua total doação, fez questão da presença de seus pais que, muito emocionados, participaram conosco da cerimônia.
Na véspera desta data fui ter com ela, sugerindo-lhe que redigisse seu ato de consagração. Como havia sido operada e não pudesse escrever, foi falando pausadamente, enquanto eu, em silêncio, de modo discreto anotava o que dizia, com fidelidade, registrando, inclusive as reflexões intercaladas. Ela não percebeu que eu escrevia.
Ângela encarou com muita seriedade o ideal de vida religiosa e foi se preparando para vivê-lo de modo generoso e exigente.
Agora, passo a vocês essas linhas, certa de que ficarão felizes de guardá-las como lembrança dessa companheira da pastoral vocacional que hoje, no céu, por todos nós intercede.
- ÂNGELA , o que você espera dessa Consagração ?
“Que Deus me dê paciência e coragem para viver, como doente, uma consagração a Ele, que não pude levar a frente numa vida ativa”.
“Quero uma consagração que seja só a Deus, para a glória d’Ele e o bem da humanidade… não procurando só a mim, mas que abranja a todos, não importa quem”.
“Sempre procurei rezar e pedir pelas vocações e o Santíssimo Sacramento…”
“(Irmã, agora não sei mais…)”.
“Puxa, eu quero uma entrega total a Deus. Saber o que se passa no mundo, mas, como Santa Teresinha que amou a todos, sem nada querer para si. Como Nossa Senhora que disse o “SIM” dela.”
“(…Estou tão enrolada!…)”
“Quero que, com a minha consagração, minha família seja sempre honesta e direita; que em mim, Deus possa mostrar a meus irmãos um caminho reto para Ele”.
- Você falou de vocações. O que você pediria a Deus por elas, nesta sua consagração?
“Que a cada ano que passe as vocações aumentem. Mas, vocações com ideal de seguir realmente o caminho de Cristo. Que sejam jovens autênticos, que digam “aqui é que eu quero ir, aqui é que eu quero ficar,” e ponham a cabeça no lugar. E quando eles estiverem em apuros, que recorram ao SANTÍSSIMO SACRAMENTO…”
(“Não sei se estou dizendo muita coisa infantil…”)
(“A gente quer dizer muita coisa a Ele… mas não precisa dizer nada; é um problema, não?”).
- O que representa para você esta Consagração?
“Para mim é uma entrega de amor total a Deus, sem querer saber das vaidades do mundo, das paixões que cercam a gente. Amar o mundo, mas procurando mais a Deus”.
(“Irmã, se eu soubesse que tinha de escrever tanto, teria começado ontem!”)
“No momento não me lembro de mais nada… Sempre tive uma vida simples. Tinha gente que julgava a minha vida monótona, boba, mas eu não achava assim. Aprendi a viver uma vida simples. Sempre passeei muito… mas procurava fazer de meus passeios uma oração. Desta forma eu consegui ficar na cama. Se eu não tivesse procurado me educar desse jeito, não o conseguiria agora. Enquanto os outros namoravam, eu também dava uma de romântica, mas, diferente… ficava contemplando… Deus me preparou para o que ia acontecer”.
“Mas, na hora de rezar é um desastre! Sempre foi! Parece que o diabinho vem dar umas voltas…”
“Para mim, é uma doação que eu quero, que sempre pedi a Deus, desde criança… e que faço por livre e espontânea vontade. Poderia estar casada, com filhos, mas não quis, por causa da vocação!…”
No dia seguinte as religiosas do hospital colocaram Ângela num quarto grande, pois que além da família e amigos, muitos enfermeiros, médicos e atendentes desejavam participar da Santa Missa de Consagração que seria ali celebrada por Dom Romer, Bispo responsável pelo setor das Vocações e Vida Religiosa na Arquidiocese.
E Deus não tardou em vir buscar esta jovem, que partiu na alegria de só a Ele pertencer…
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