O Sínodo da família e as paixões de ignomínia
Todo católico deveria detestar abordar questões que São Paulo não queria nem sequer que fossem mencionadas entre os cristãos:
“Sede, pois, imitadores de Deus,
como filhos muito amados, e andai no amor, como também Cristo nos amou e
se entregou a si mesmo por nós a Deus, como oferenda e hóstia de suave
odor. Nem sequer se nomeie entre vós a fornicação ou qualquer impureza
ou avareza, como convém a santos…” (Efésios 5, 1-3).
Enquanto o grande Apóstolo formava em
seus discípulos a outros Cristos, não podia admitir que houvesse ainda
entre eles escravos das paixões carnais e do espírito de concupiscência:
“Com efeito, sabei-o bem, nenhum
fornicador ou impudico ou avaro, o qual é um idólatra, terá herança no
reino de Cristo e de Deus” (ibidem, 5, 5).
No entanto, o mundo contemporâneo há
muito retornou às perversões mais infamantes, esquecendo-se do destino
reservado a Sodoma e Gomorra (1). Assim como a pederastia, a
bestialidade e muitas outras perversões sexuais se alastram nas
sociedades modernas, ao mesmo tempo diminuem o pudor, a fidelidade, a
abstinência e todas as virtudes capazes de aplacar a concupiscência.
Contra a lei natural e divina
Frente aos ataques contra o casamento
cristão, e agora contra o casamento natural (a união estável de um homem
e uma mulher em uma casa, com o fim de gerar e criar filhos), a Igreja
Católica recorda incansavelmente a verdade da moral evangélica:
“Porventura não sabeis que os
injustos não possuirão o reino de Deus? Não vos enganeis: nem os
fornicadores, nem os idólatras, nem os adúlteros, nem os efeminados, nem
os sodomitas, nem os ladrões, nem os avarentos, nem os que se dão à
embriaguez, nem os maldizentes, nem os roubadores possuirão o reino de
Deus” (I Coríntios 6, 9-10).
O pecado da homossexualidade é uma grave desordem cujo ato específico é colocado pela Sagrada Escritura entre os “pecados que clamam ao céu”,
como o homicídio ou a opressão à viúva e ao órfão. Os pecados que
clamam ao céu são aqueles cuja maldade, e particularmente a perturbação
da ordem social que provocam, pedem, desde a terra, uma justa vingança
da parte de Deus (2).
Isso mostra a gravidade do pecado da
homossexualidade, não obstante, banalizado e até mesmo promovido por
todos os tipos de organizações e outros meios de propaganda. Pensemos
nas associações “LGBT”, nos filmes, moda, paradas e desfiles (“orgulho gay”) que inundam todos os anos as ruas das metrópoles do mundo.
A Igreja Católica não escapa a esta
pressão que vem de um mundo depravado e de costumes corruptos. Até
agora, ela tinha conseguido lembrar às pessoas o caráter antinatural e a
ignomínia ou infâmia desse tipo de pecado. O novo Catecismo, em 1992,
ainda podia escrever no seu número 2357:
”Apoiando-se na Sagrada Escritura, que os apresenta como depravações graves (3) a Tradição sempre declarou que ‘os atos de homossexualidade são intrinsecamente desordenados’ (4).
São contrários à lei natural, fecham o ato sexual ao dom da vida, não
procedem duma verdadeira complementaridade afetiva sexual, não podem, em
caso algum, ser aprovados”.
As profundas divisões entre os Padres Sinodais
A preparação do sínodo sobre a família,
paradoxalmente, deu uma tribuna para os promotores ou apoiadores da
banalização da homossexualidade. No dia 13 de outubro de 2014, o Relator
geral do Sínodo, o cardeal húngaro Péter Erdö, deixava-o evidente num
documento que se tornou público em presença de duzentos jornalistas.
Titulado Relatio post disceptationem, descrevia a estima pelos “dons e qualidades” que os homossexuais tinham “para oferecer à comunidade cristã”
(Relatio, nº. 50). Ao rejeitar qualquer equivalência com o matrimônio
entre um homem e uma mulher, e por causa da pressão internacional em
favor da ideologia de gênero (ibid. nº. 51), o Sínodo “leva em consideração que há casos em que o apoio mútuo, até o sacrifício, é uma ajuda valiosa para a vida dos casais!”
(nº. 52). Durante a mesma conferência de imprensa, o arcebispo Bruno
Forte, secretário especial do Sínodo e presumivelmente autor dos
parágrafos escandalosos, declarou:
“Acho que o documento procura
aspectos positivos onde se possam encontrar estes elementos dentro
dessas uniões. É fácil rejeitar uma coisa, mas reconhecer e valorizar
tudo o que é positivo, mesmo dentro destas experiências, é um exercício
de honestidade intelectual e de caridade espiritual”.
Então, pela primeira vez na sua
história, através de canais oficiais, a Igreja prega acolher aos
homossexuais como tais. O desafio não é mais de aqui em diante a
conversão e o chamado à penitência, o combate contra as tendências
desordenadas e pecaminosas, mas à capacidade “de receber essas pessoas garantindo-lhes um espaço de fraternidade em nossas comunidades”, enquanto que, na prática e publicamente, vivem em tais vícios.
O escândalo foi imenso e as reações a
este relatório provisório não demoraram em sentir-se. Quando
entrevistado pela Rádio Vaticano no dia 13 de outubro, o bispo Stanislas
Gadecki, arcebispo de Poznan e Presidente da Conferência Episcopal da
Polônia, não teve medo de declarar: “Este documento é inaceitável”.
Os bispos africanos também expressaram seu profundo desacordo: no
Twitter, o cardeal William Fox Napier, arcebispo de Durban, se opôs
fortemente aos artigos sobre a homossexualidade, ao que o Cardeal Walter
Kasper respondeu em uma entrevista aos repórteres, que os bispos
africanos “não deveriam nos dizer o que fazer”. – Alguns meses mais tarde, o Cardeal Napier teve que falar do desprezo condescendente do cardeal Kasper, que “acredita
que os bispos africanos são demasiado submissos a tabus e muito
relutantes em abordar a questão da poligamia e do casamento entre
pessoas do mesmo sexo“.
Ainda assim, em 18 de Outubro, o
relatório final do Sínodo se empenhava em apagar o fogo usando uma
manobra para chegar a um acordo. Inteiramos-nos de que o parágrafo sobre
os homossexuais foi posto à votação, obtendo 118 votos a favor e 62 de
desaprovação. O padre Federico Lombardi, diretor da Imprensa da Santa
Sé, salientou que, embora os parágrafos “não tenham atingido a maioria qualificada, foram esmagadoramente aprovados“. Por esta razão o próprio Papa Francisco havia desejado que os parágrafos rejeitados fossem também publicados, “a fim de ampliar o debate”.
Embora este texto, de acordo com o padre Lombardi, “não é um documento do Magistério disciplinar”,
o problema é complexo. Como um comportamento antinatural e
intrinsecamente desordenado pode ser apresentado tão positivamente? Como
um pecado que clama ao céu tornou-se uma “orientação sexual” capaz de proporcionar “dons e graças”
(quais?) para a comunidade cristã? O que significa em última análise
este elogio, apenas dissimulado, do sentido do sacrifício entre pessoas
homossexuais? Querer-se-á comparar essa “ajuda valiosa para a vida dos casais” à fidelidade e o apoio dos cônjuges no casamento? Esta seria uma daquelas “comparações blasfemas” entre o Evangelho e a revolução que São Pio X denunciava há mais de um século (5).
Como é que homens da Igreja podem encontrar valores positivos ou
assuntos de edificação em tais vícios, que são outras tantas situações
de pecado?
Mons. Huonder é rejeitado por seus colegas
No dia 31 de julho de 2015 um bispo
suíço valentemente lembrou o ensinamento moral da Igreja sobre estas
questões durante uma conferência intitulada “O casamento: dom, sacramento e missão”.
Mons. Vitus Huonder, bispo de Chur, se expressava na Alemanha, Fulda,
no Fórum Deutscher Katholiken. Como teve a desgraça de citar a Sagrada
Escritura (Levítico, 18, 22 e, especialmente, Levítico 20, 13: “Aquele
que pecar com um homem, como se ele fosse uma mulher, ambos cometeram
uma coisa execranda, sejam punidos de morte; o seu sangue caia sobre
eles”), o bispo de Chur foi objeto de um “veredicto mediático”, ou seja, de uma campanha de pressão organizada por certos grupos de lobby
homossexuais destacada pelos meios de comunicação e por várias figuras
públicas. Por mais que Mons. Huonder tentasse acalmar os ânimos e
esclarecesse que ele tinha citado uma dúzia de outras passagens das
Escrituras tiradas do Antigo e Novo Testamento, que tinha tomado
essencialmente o ensino do Catecismo e que, obviamente, não tinha a
intenção de chamar ao assassinato dos homossexuais, nada conseguiu. O
presidente do Partido Democrata Cristão, Christophe Darbellay,
qualificou as palavras do bispo de Chur como “inaceitáveis”.
Pior ainda, a Conferência dos Bispos
Suíços rejeitou rapidamente o seu colega de episcopado, que é objeto de
uma denúncia junto aos tribunais e recebeu ameaças de morte. O
Presidente desta Conferência, Dom Markus Büchel, bispo de São Galo,
declarou alegrar-se:
“de cada relacionamento em que os parceiros da união se aceitam mutuamente como filhos amados de Deus” (sic).
E acrescentou:
“Nossos conhecimentos atuais sobre a
homossexualidade como um investimento afetivo e orientação sexual não
escolhido livremente não eram conhecidos nos tempos bíblicos”.
De modo que hoje a Igreja tem o dever de acompanhar os homossexuais em seu modo de vida:
“Um caminho no qual possam integrar a sua forma particular de relacionamento e sua sexualidade como um dom de Deus em sua vida” (sic).
Não se poderia preparar melhor o
reconhecimento e a bênção deste tipo de união. Especialmente porque o
Presidente da Conferência Episcopal acrescenta que a Igreja deve “encontrar uma nova linguagem, adequada às situações e às pessoas (6)’’.
Finalmente, Mons. Charles Morerod, Bispo
de Genebra, Lausanne e Friburgo, dizia ao jornal Le Temps, de 12 de
Agosto de 2015, que “o fato de ser homossexual, especialmente sem escolha pessoal, não é um crime, nem um pecado”.
E explicava que a maioria dos homossexuais descobriu-se como tais, sem
vontade deliberada e, portanto, sem responsabilidade moral! Assim, a
história recordará que foi necessário esperar até o século XXI para que
os homens da Igreja tratassem de justificar teologicamente os
comportamentos mais vergonhosos ou infames. Mons. Morerod afirma que a
moral cristã não é praticável integralmente a não ser para aqueles que
têm a fé, mas esquece de mencionar que, mesmo sem a fé todos os homens
podem julgar a retidão de suas inclinações. O que aconteceu com a lei
natural? A virtude da castidade, que é parte da virtude cardeal da
temperança, não obriga a todos os homens dotados de razão?
O que vai acontecer no próximo Sínodo?
Por medo ou covardia, encorajados também
– lamentavelmente – pelas palavras do Papa Francisco, que convidam a
dar provas de acolhida e de misericórdia para com os homossexuais (“Se uma pessoa é gay (7) e busca ao Senhor com boa vontade, quem sou eu para julgá-la?” (8), subjugados pelo “espírito do Concílio”, que quis proclamar um novo humanismo centrado no culto ao homem e à pessoa (9),
os homens da Igreja desprezam de agora em diante os deveres do próprio
cargo. Parecem esquecer a existência da moral natural mais elementar,
como se enquanto nossos contemporâneos não aceitam a fé fosse inútil
pregar-lhes os bons costumes.
Além disso, como ensina São Paulo aos
Romanos, sem a fé em Jesus Cristo, todos os homens estão em pecado e sob
a ameaça da ira divina. O mundo atual, que rejeitou o seu Salvador, sua
Lei de amor e os seus mandamentos, voltou a cair no paganismo mais
vergonhoso, do qual o Apóstolo dos gentios não teme descrever como
paixões de ignomínia:
“Por isso Deus entregou-os a paixões
de ignomínia. Efetivamente as suas próprias mulheres mudaram o uso
natural em outro uso, que é contra a natureza, e, deste modo, também os
homens, deixando o uso natural da mulher, arderam nos seus desejos
mutuamente, cometendo homens com homens a torpeza e recebendo em si
mesmos a paga que era devida ao seu desregramento” (Romanos 1, 26 – 27). (10)
Mas se são culpados aqueles que se entregam a isso, são ainda mais culpados “os que aprovam aos que fazem tais coisas” (ibídem, 1, 32). Pois “Ai de vós os que ao mal chamais bem, e ao bem mal, que tomais as trevas por luz, e a luz por trevas”
(Isaías, 5, 20). Possa o próximo Sínodo, sob a autoridade do Sumo
Pontífice, dissipar a fumaça de Satanás que obscurece a luz da fé e da
razão.
Cristo disse em primeiro lugar aos pastores do rebanho:
“Vós sois a luz do mundo. Não pode
esconder-se uma cidade situada sobre um monte; nem se acende uma
lucerna, e se põe debaixo do alqueire, mas sobre o candeeiro, a fim de
que de luz a todos os que estão em casa” (Mateus 5, 14-15).
Padre Christian Thouvenot, FSSPX
Fonte: DICI.org – DICI nº. 320 de 09.11.15
- A destruição de Sodoma e Gomorra se narra no Livro do Gênesis, capítulos 18 y 19.
- Padre Dominique Prümmer, O.P.: “Manual de teología moral”, Herder, 1961, tomo I, núm. 360.
- Cfr. Gênesis, 19, 1-29; Romanos, I, 24-27; I Coríntios, 6, 9-10; I Timóteo, 1,10.
- Congregação para a Doutrina da Fe, declaração “Pessoa humana”, 29 de dezembro de 1975, núm. 8.
- En “La Lettre sur le Sillon”, 25 de agosto de 1910.
- Cat.ch – APIC, 9 de agosto de 2015.
- Palavra inglesa com que se refere a um homossexual.
- Conferencia de prensa del 28 de julio de 2013.
- “Nós também, nós mais que ninguém, temos o culto do homem”.
- “É um pecado gravíssimo e abominável diante de Deus e dos homens; rebaixa ao homem à condição dos animais sem razão, o arrasta a muitos outros pecados e vícios y acarreta os mais terríveis castigos nesta vida e na outra” (“Grande Catecismo de São Pio X”, Os mandamentos de Deus, Dominique Martin Morin, 1967, p. 97.
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