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quinta-feira, 12 de setembro de 2013

Homem que papa escolhe para nº 2 da Igreja lembra que celibato sacerdotal não é dogma. E não é mesmo!



Sei que vem uma confusão danada por aí e que vou apanhar de novo. Fazer o quê? Meu único compromisso aqui é dizer o que penso. E vou fazê-lo mais uma vez. Pietro Parolin, o novo secretário de Estado do Vaticano, que passa a ser o nª 2 da Igreja para muitos assuntos, concedeu uma entrevista ao jornal venezuelano “El Universal” no domingo e afirmou o que já sabemos e se repetiu dezenas de vezes neste blog: o celibato de padres e freiras é uma escolha que fez a Igreja, não um dogma. Como tal, pode ser revisto, sim. Ele é núncio apostólico no país até outubro, quando assume a sua função no Vaticano. Reproduzo um texto publicado aqui no dia 22 de março de 2010 sobre o tema.
*
“Já escrevi duas levas de textos contra o celibato de padres da Igreja Católica. A primeira foi em outubro de 2007. Integram esse grupo posts como
O desastre do celibato:São Pedro tinha sogra! e Igreja não é armário. Voltei com uma nova série em 2008, quando o padre Júlio Lancelotti foi acusado de molestamento por um rapaz com quem ele mantinha uma relação que se mostrou imprópria, ainda que fosse pia.
Vejo, agora, a Igreja sacudida por novas acusações de pedofilia na Europa e no Brasil: há um caso escabroso em Arapiraca, em Alagoas, noticiado na VEJA desta semana. Como o ódio à Igreja é grande mais por seus acertos do que por seus erros, procura-se magnificar o que já é criminoso e desastroso: tenta-se arrastar o próprio papa para o centro do furacão: seu irmão, também sacerdote, teria protegido um padre pedófilo. E isso não vai acabar tão cedo. Aproveita-se a fragilidade da Igreja para tentar pôr a igreja de joelhos — diante do laicismo, não de Deus.
A condição de casado ou celibatário, em si, não faz alguém ser mais ou menos fiel aos princípios que abraçou. Mas é inegável que a exigência do celibato acaba sendo, em muitos casos, uma solução socialmente aceitável para muitos rapazes que, de outro modo, teriam de se haver com explicações nem sempre fáceis perante a família e a comunidade. Que importa que a esmagadora maioria dos padres cumpra o seu compromisso? Bastam uns poucos para produzir o desastre.
Não sou da hierarquia católica, apenas um católico. Como tal, não só posso como devo debater o que não for matéria dogmática. Vejo com grande tristeza, melancolia, às vezes quase revolta, os ataques vis que sofre o patrimônio moral da Igreja Católica, que tenho como um dos esteios da civilização ocidental. Eu e qualquer pessoa de juízo. A reação da hierarquia às acusações tem sido frágil, quando não é pífia. Abriu as portas da Santa Madre para o marxismo, e o mal nela se insinuou e corrói seus valores — aí, sim, ferindo muitas vezes dogmas e princípios —, mas se aferra, como é o caso do celibato, a algumas escolhas que atenderam a conveniências de época e que hoje se mostram fonte de desgaste e de humilhação. O mal entrou na Igreja, e os fiéis estão saindo.
O celibato foi instituído no ano 390 — portanto, ela viveu quase quatro séculos sem ele. Sei que vou entrar numa pinima danada. Já me bastaria o ódio dos que chamo partidários da “escatologia da libertação” (que, de teologia, não tem nada). O celibato é matéria apenas de interpretação, nada mais. Torná-lo uma questão de princípio, como é a defesa da vida — e, pois, a rejeição ao aborto —, é superestimar uma (o celibato) e rebaixar outra (a defesa da vida).
Na minha Bíbliae na sua também, leitor amigo —, São Pedro tem sogra. Sei que sou aborrecidamente lógico às vezes, mas é de se supor que tinha ou teve uma mulher: E Jesus, entrando em casa de Pedro, viu a sogra deste acamada, e com febre. E tocou-lhe na mäo, e a febre a deixou; e levantou-se, e serviu-os”. Está em Mateus, 8:14-15.
Na Primeira Epístola a Timóteo, ninguém menos que São Paulo recomenda: “Esta é uma palavra fiel: se alguém deseja o episcopado, excelente obra deseja. Convém, pois, que o bispo seja irrepreensível, marido de uma mulher, vigilante, sóbrio, honesto, hospitaleiro, apto para ensinar. Não dado ao vinho, não espancador, não cobiçoso de torpe ganância, mas moderado, não contencioso, não avarento(I Tim, 3:1-3).
Os defensores radicais do celibato pretendem dar a estas palavras um sentido diverso. Desculpem. Trata-se de forçar a barra. Na seqüência, São Paulo não deixa a menor dúvida: Que governe bem a sua própria casa, tendo seus filhos em sujeição, com toda a modéstia. Porque, se alguém não sabe governar a sua própria casa, terá cuidado da igreja de Deus?)” (I Tim, 3:4-5).
Não quero ser ligeiro. Sei bem que há outras passagens que endossam o celibato. Mas fica claro que se trata de uma questão de escolha, sim, não de fundamento; trata-se de uma questão puramente histórica, não de revelação. O celibato pode ter sido útil em tempos bem mais difíceis da Igreja. A dedicação exclusiva à vida eclesiástica pode ter feito um grande bem à instituição. Mas é evidente que se tornou um malefício, um perigo mesmo, fonte permanente de desmoralização. A razão é mais do que óbvia. A maioria dos padres, é possível, vive o celibato e leva a sério o seu compromisso. Mas é claro que o sacerdócio também se tornou abrigo de sexualidades alternativas, que não têm a mesma aceitação social do padrão heterossexual. E que se note: também existem desvios de conduta de padres heterossexuais.
Poderá perguntar alguém: pudesse o padre casar, a Igreja estaria absolutamente protegida de um adúltero, por exemplo? É claro que não. Mas não tenho dúvida de que estaria muito menos cercada de escândalos. Talvez se demore mais um século até que isso venha a ser debatido, sempre no tempo da Igreja Católica, que não é este nosso, da vida civil. Mas é importante que os católicos, em especial aqueles que não aderiram a heresias marxistas, comecem a pensar que o celibato não compõe o núcleo da doutrina cristã ou um fundamento do catolicismo. Foi, num dado momento, a escolha de uma forma de organização. Que, hoje, traz mais malefícios do que benefícios.
Sou o primeiro a considerar que a Igreja não tem de ceder a todos os apelos da, vá lá, modernidade, abrindo mão de seus princípios. Só que falta provar que o celibato é um princípio. Não é. De fato, a obrigação de um sacerdote deveria ser outra, como queria São Paulo: Convém, pois, que o bispo seja irrepreensível, marido de uma mulher, vigilante, sóbrio, honesto, hospitaleiro, apto para ensinar.”
A obrigação deveria ser o casamento, não o contrário.
Compreendo — e tenho até certa atração intelectual por elas — algumas inteligências que, ao perceberem que determinado remédio resulta num malefício, decidem dobrar a dose para ver se não foi a falta de convicção que trouxe o resultado contraproducente. Há nisso um certo pessimismo místico e algum triunfalismo da derrota: “Perderemos, mas sem jamais ceder.” É, eu detesto perder. A mim me preocupa a crescente secularização da Igreja em matérias que são realmente de dogma, enquanto permanece aferrada a algumas práticas que constituem mais uma esfera de costumes.
Erro
É um erro supor que o debate sobre o fim do celibato integre o cardápio da esquerdização da Igreja. Aliás, é curioso notar que os expoentes da Teologia da Libertação no Brasil — com a provável exceção da audácia do Boff — passam longe do assunto. O celibato confere aos padres petralhas uma certa aura de santificação (e, acho eu, isso, sim, cheia a pecado) que melhor esconde a sua atuação política.
É evidente que o primeiro efeito positivo do fim do celibato seria atrair para a Igreja vocações que não estão dispostas a abrir mão da bênção que é ter uma família. E, ao longo do tempo, o sacerdócio deixaria de ser um refúgio — e os escândalos estão aí à farta — para os que pretendem usar a Igreja como resposta socialmente aceita a suas inapetências e gostos. A Igreja, aqui e no mundo, está a precisar menos de homens que imitem Cristo num particular e mais de homens que sigam as leis gerais do Cristo. Não é, infelizmente, o que se tem amiúde visto. Também essa escolha traria novos problemas para a Igreja? Sem dúvida. Acho, no entanto, que o ganho seria, ao longo do tempo, bem maior do que o prejuízo.
Disciplina
Sou o primeiro a afirmare, se vocês procurarem no Google, vão encontrar opiniões minhas anteriormente expressas a respeitoque ninguém é enganado ao escolher pertencer à hierarquia católica. O padre sabe que está obrigado à castidade e ao celibato. Portanto, a menos que peça desligamento, não pode fugir a essas duas práticas, entre muitas outras. Eu posso lastimar o que considero malefícios óbvios da castidade. Ele não pode. O que lhe está reservado é fazer de sua própria vida um testemunho exemplar a) de sua fé; b) de observância das leis da Igreja. Infelizmente, as coisas não têm sido bem assim, não é mesmo? Para tristeza e estupefação dos católicos no Brasil e no mundo inteiro. 

Estou dizendo que, ao longo da história, o que foi uma seleção de homens para construir, com dedicação exclusiva, a Igreja de Cristo, tornou-se fonte de perturbação e de desmoralização. Para seguir “princípios”? Não! Trata-se de uma escolha feita, num dado momento e sob certas circunstâncias históricas, que hoje contamina o tecido da Igreja com um óbvio mal-estar.

Não fiz a contabilidade. Mas tendo a achar que existem na Bíblia mais recomendações em favor do casamento do que contra ele. Mas, ainda aqui, estaríamos só no terreno da literalidade. A minha pergunta é outra: o que há na mensagem espiritual de Cristo que recomende que o homem, sacerdote ou não, viva apartado da mulher? Olhe aqui: não importa a que corrente da Igreja você pertença — ou, mais amplamente, do cristianismo, e a resposta é uma só: NADA!!!

Uma Igreja que pudesse acolher um número muito maior de vocaçõeshomens que pudessem formar família — constituiria, aí sim, a verdadeira comunidade eclesiástica. Não é preciso ser muito agudo para perceber que os padres vivem uma realidade que absolutamente os aparta da vida real. E para quê? Para que possam se dedicar mais a Deus e à Palavra? Lamento muito: isso é mentira! Boa parte deles, hoje, infelizmente, ignora até o texto bíblico. O que parece uma vida de renúncia se confunde mais com alienação. Além, claro, da permanente tentação demoníaca da “Escatologia da Libertação”.

O celibato tem de acabar não para revolucionar a Igreja. Trata-se de um movimento de “conservação”. De certo modo, corroída pela “revolução”, ela está hoje. Quantas forem as recomendações contra o casamento que os “literalistas” encontrarem, asseguro, outras poderão ser encontradas a favor dele. A Igreja deve ser um lugar onde se vive uma convicção, não onde se esconde uma condição. Igreja não é armário.

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