O encontro com o papa
Francisco no Rio foi a grande chance de Dilma Rousseff aparecer bem desde
que a economia derrubou 8 pontos de sua popularidade e as manifestações lhe
roubaram outros 27. No mínimo, ela ganhou uma excelente foto, num dia em
que as pessoas foram às ruas felizes por receber o papa - e não só para
reclamar.
Nesse momento de profunda descrença nos partidos e
muita crença na chegada de um papa que simboliza ruptura e humildade, o
contraste só pode ter sido proposital: com o mesmo voluntarismo de sempre, Dilma não foi à reunião do diretório do PT por um motivo
pueril, numa clara provocação, e foi ao papa com um discurso político
e fora de lugar.
Digamos
que Francisco foi Francisco, Dilma foi Dilma. Um foi o papa
despretensioso, que dispensa ouro, capas de veludo e pompas para se
colocar cada vez mais próximo do povo. A outra foi a presidente de expressão
arrogante, num momento em que está acuada, precisa se justificar e luta
bravamente para recuperar a popularidade perdida.
Enquanto
a fala do papa foi essencialmente religiosa e despojada, num português agradável
e cheia de adjetivos gentis para o Brasil e para os jovens, Dilma recorreu a
todos os chavões lulistas, enalteceu as mudanças "que inauguramos dez anos atrás" e amplificou a versão de Lula no "New York Times", definindo as manifestações que atingiram em cheio seus
índices nas pesquisas não como a derrota que foi, mas como uma vitória
sua e de Lula.
No
discurso da presidente, pulularam autoelogios ao Brasil e à era petista, além
de chavões de palanque: direitos, justiça
social, solidariedade, fome, desigualdade, ética, transparência. Eis a dúvida: para
quem Dilma estava falando? Para o papa ou para o eleitor? Para o milhão e meio da Jornada Mundial da Juventude
ou para o milhão e meio de pessoas nas ruas exigindo
dignidade, fim da corrupção, serviços decentes?
Valeu
pela foto, não pela fala.
Fonte: Eliane
Cantanhêde – Folha de São Paulo
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