Na raiz da promoção massiva do aborto também está a falta de uma visão
da vida como algo sagrado, ou como um mistério.
O homem atual sente-se dominador da natureza, e não como administrador. Será que a Ciência não é culpada disso? Afinal, foi a Ciência que nos deu poder de manipular a natureza e portanto, em última análise, só por causa do poder que ganhamos dela é que nos sentimos donos da natureza.
Na realidade o argumento está mal colocado. É verdade que a Ciência nos deu poder sobre a natureza (ainda que limitado). Mas esse poder não é mau em si, pois pode ser empregado de uma forma boa ou má. Mais uma vez estamos diante do grande dilema existencial humano: fomos criados livres por Deus. Cabe a cada um de nós escolher qual caminho tomar e arcar com as consequências.
O homem atual sente-se dominador da natureza, e não como administrador. Será que a Ciência não é culpada disso? Afinal, foi a Ciência que nos deu poder de manipular a natureza e portanto, em última análise, só por causa do poder que ganhamos dela é que nos sentimos donos da natureza.
Na realidade o argumento está mal colocado. É verdade que a Ciência nos deu poder sobre a natureza (ainda que limitado). Mas esse poder não é mau em si, pois pode ser empregado de uma forma boa ou má. Mais uma vez estamos diante do grande dilema existencial humano: fomos criados livres por Deus. Cabe a cada um de nós escolher qual caminho tomar e arcar com as consequências.
A Ciência é algo desejado por Deus desde o
princípio pois é um fruto natural da inteligência humana, dom do
Criador. Quando bem utilizada, faz com que admiremos a Criação e
encontremos nela reflexos de Deus. Eu diria até mais, que quando a
pesquisa científica é orientada de acordo com os princípios éticos da
lei natural colocada por Deus no coração de todos os homens, essa
Ciência contribui para os desígnios de Deus no mundo. Ou seja, a boa
pesquisa científica faz parte dos muitos e tão diversos mecanismos que a
Providência Divina utiliza para levar o mundo ao fim último desejado
pelo Criador.
Um cientista que trabalha de acordo com a
reta razão, acredite em Deus ou não, irá encontrar-se com o mistério no
seu trabalho. Normalmente, esse mistério se revelará por meio da beleza
da natureza. Mas também poderá aparecer na bondade de todas as coisas
que notavelmente estão ordenadas para uma harmonia entre si. Além disso,
as grandes leis que regem os fenômenos naturais são coerentes entre si e
formam uma espécie de tecido lógico impressionante e mais admirável
ainda por ser compreensível para nós. Ou seja, o cientista que usa bem
sua razão irá encontrar na natureza os atributos de Deus: a beleza, a
bondade e a verdade.
Mas o que significa um cientista agir com
a reta razão? Significa muitas coisas, mas principalmente que ele não
extrapola para além do mundo material as conclusões empíricas que a
Ciência lhe permite obter. A Ciência fala sobre o mundo material, não
sobre o que lhe causou ou sobre a finalidade para que foi criado.
Leia também: Nossa primeira vocação: A Vida
Entretanto, muitos cientistas querem
passar a ideia de que a Ciência permite concluir sobre as razões e as
finalidades do universo, algo que é um abuso tremendo e que comumente
chamamos de cientificismo, ou seja, uma espécie de doutrina científica
que não encontra fundamento na própria Ciência mas que mesmo assim é
assumida por muitas pessoas. Cabe denunciar este cientificismo sem, no
entanto, confundi-lo com a Ciência em si. A consequência mais imediata do
cientificismo é fazer o homem esquecer que a natureza foi criada e que
não lhe pertence. Ou seja, que desde o início Deus nos colocou como
meros administradores da sua criação e nos convidou a levá-la à
plenitude com Ele, dando-nos um poder imenso de sermos co-criadores
através do nosso trabalho.
Para o cientificista é lícito fazer
qualquer violência à natureza desde que lhe seja conveniente. Muitos
mascaram essa “conveniência” sob causas “bonitas”. É o caso das células
tronco embrionárias, da eugenia, do aborto de tantos outros crimes
contra a vida que são justificados com algo bom para o ser humano, como
uma terapia ou a simples escolha de fazer da própria vida o que se
quiser. Não vou entrar no mérito destes
argumentos, mas quero sublinhar que no fundo eles têm uma origem comum:
ganhamos tanto poder sobre a natureza com a Ciência que não percebemos
mais o caráter sagrado da natureza como Criação de Deus. Muitos a veem
como um meio para satisfazer os desejos do homem.
Assista também: Que postura um católico deve ter diante da luta contra as leis que visam aprovar o aborto?
Só a fé cristã permite conciliar
plenamente a Criação e a Razão que Deus nos deu. É somente sob a
perspectiva de sermos também nós criaturas de Deus e de estarmos aqui
para cumprir um desígnio sagrado que podemos tomar consciência de que a
natureza deve ser usada para este mesmo desígnio e que não temos o
direito de fazer violência contra a própria identidade das coisas.
Dizer que a vida humana só começa na 14ª
semana de gravidez (ou qualquer outra semana) é um exemplo de como
distorcemos a própria identidade das coisas. Não podemos estabelecer um
momento para quando começa a vida humana. Não importa quando surgem as
faculdades neurológicas do feto, ou quando ele tem ou não condições de
sobreviver fora do útero materno.
De modo mais geral, nada que possa ser
dito sobre as atividades naturais do feto pode ser usado como
determinante do início da vida. Fazendo uma regressão extrema, nem mesmo
o momento da entrada do espermatozoide no óvulo pode ser usado, pois
não acontece num instante, mas num espaço de tempo.
Não podemos cair no jogo de discutir
quando a vida começa, pois a questão não é essa, mas se temos ou não o
direito de interferir. O começo da vida está cercado de mistério, pois é
o início da existência de todo ser humano. Tentar definir esse momento é
assumir que a vida humana é algo somente natural e esquecer que temos
alma, que fomos desejados desde toda a eternidade por Deus Criador e que
também somos suas criaturas. Respeitar o caráter sagrado da vida é algo
que só faz sentido se limitamos a Ciência ao seu lugar correto de
método investigativo e não tentamos usá-la inapropriadamente para
validar filosofias malignas.
É plenamente possível e necessário
conciliar a Fé cristã com a Ciência. Somente assim poderemos admirar a
criação e levá-la ao fim determinado pelo seu Criador. A vida,
especialmente a vida humana, um grande mistério, que o cientista deve
aprender a admirar e aceitar que não pode ser violado.
Alexandre Zabot - Físico e doutor em Astrofísica – Professor da UFSC
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