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quinta-feira, 14 de março de 2013

‘Sou um pecador, mas, como essa tarefa me foi dada, aceito’, disse Bergoglio

Ao aceitar escolha, Papa afirmou ser um ‘pecador’

Na primeira votação, argentino já teria saído na frente

“Sou um pecador, mas, como essa tarefa me foi dada, aceito”. Com essa frase, o então arcebispo de Buenos Aires, Jorge Mario Bergoglio, teria aceitado a escolha dos cardeais eleitores, na quinta votação, que lhe deu os dois terços de votos necessários para convertê-lo no primeiro Pontífice jesuíta e latino-americano. Passado o susto da escolha, que pegou praticamente todo o mundo de surpresa, alguns cardeais presentes no conclave explicam como o Papa do “fim do mundo” foi eleito. Segundo a imprensa italiana, a candidatura de Bergoglio ganhou força na noite de terça-feira.

 

 O recém eleito Papa Francisco no dia seguinte a sua eleição: ascendência italiana teria pesado na escolha dos cardeais ALESSANDRO BIANCHI / REUTERS

A primeira votação não chegou a um nome, segundo o cardeal irlandês Sean Brady. Mas de acordo com o jornal “La Stampa”, nem bem a fumaça preta havia se dissipado, começaram reuniões informais na Casa de Santa Marta, onde os religiosos estavam hospedados. Num desses encontros, o argentino teria recebido o apoio dos influentes italianos Giovanni Re e Tarcisio Bertone, este também camerlengo. - Quando acabou, ficou claro que as preferências eram bem variadas - disse Brady, líder da Igreja na Irlanda. - Houve vários candidatos.

Na manhã de quarta-feira, após três votações, os eleitores fizeram uma nova procissão e repetiram o ritual. A vitória de Bergoglio começou a se desenhar já na noite anterior, quando ele obteve o maior número de votos no primeiro escrutínio, embora o resultado tivesse sido pulverizado demais para consolidar a maioria absoluta. - Quando você anda com a cédula na mão e para em frente ao afresco do “Juízo Final” é uma grande responsabilidade - disse o cardeal americano, Sean O’Malley à agência AP.

Durante o almoço de quarta-feira, O’Malley se sentou com Bergoglio. Com a votação inclinando-se a seu favor, o arcebispo de Buenos Aires, sempre sorridente, já se mostrava sombrio. - Ele é muito acessível, muito amigável. Tem um bom sentido de humor, é diligente. É muito agradável estar com ele.

Na primeira votação da tarde, os cardeais chegaram bem perto de uma decisão. Mas ainda não totalmente. Começaram então a última eleição. Enquanto eles liam as cédula, os religiosos começaram a se dar conta que haviam chegado ao nome de Bergoglio. - Foi um momento muito comovente, à medida que se escutavam os nomes - disse o irlandês Sean Brady. - Bergoglio... Bergoglio... e de repente chegamos ao número mágico de 77.

Os cardeais aplaudiram. Timothy Dolan, de Nova York, disse que todos os presentes se emocionaram. - Não acreditado que tenha havido um olho seco na casa (capela) - disse.
Bergoglio anunciou o nome que assumiria - Francisco - e foi se vestir com a indumentária papal na “Sala das Lágrimas”, uma sacristia que tem esse nome porque muitos outros Papas choraram diante da imensidão da tarefa que lhes aguardava. Quando Bergoglio voltou ao recinto, já como líder da Igreja, seu primeiro ato foi caminhar até um cardeal em cadeira de rodas na parte dos fundos da capela, para saudá-lo, contou o irlandês.

Os assistentes levaram uma plataforma com uma cadeira branca para que Francisco se sentasse, enquanto os outros iam um a um expressar seu respeito. Ele recusou o assento especial. - Sentou-se conosco, no mesmo nível - afirmou Dolan. - Senti uma estranha emoção ao beijar seu anel de Papa. É muito difícil explicar.

Era o momento de enfrentar o público. Mais de 100 mil pessoas se reuniram na Praça São Pedro, e da sacada, Francisco se preparava para recebê-los. Trabalhadores do Vaticano fizeram fila para apertar sua mão, mas o Papa se preocupava com atraso. - Havia muitas pessoas lá fora na chuva, e ele não queria que esperassem muito - contou o cardeal americano.

Previsões erradas
Após o anúncio, a primeira providência dos jornais foi desconstruir as próprias previsões, que apontavam principalmente para Scola e para o brasileiro Odilo Scherer, arcebispo de São Paulo. Para o “La Stampa”, Scola se revelou um “gigante com pés de barro” ao não conseguir formar consenso em torno de seu nome mesmo entre os 28 cardeais italianos. Contra ele teriam pesado a forte oposição da Cúria romana - em especial de Bertone e do cardeal italiano Angelo Sodano - e suas próprias ligações com o Comunhão e Libertação (CL), um movimento carismático italiano com fortes e controvertidas ligações com políticos.

Paralelamente, diz o jornal, ganhou impulso o movimento pela eleição de um Papa do Novo Mundo, uma vez que a grande força da Igreja Católica se encontra hoje na África, na Ásia e, principalmente, nas Américas. Ou, como disse um cardeal africano que o “La Stampa” citou sem relevar a identidade: “Não é possível ter o pastor na montanha e o rebanho no vale”. Ao mesmo tempo, a Igreja latino-americana vem perdendo fiéis de forma crescente para seitas neopentecostais. Um Papa do continente poderia dar novo ânimo aos católicos locais.

Porém, mesmo entre os cardeais das Américas, Bergoglio não era o mais cotado. Os vaticanistas citavam sempre, além de Scherer, o canadense Marc Ouellet e os americanos Timothy Dolan e Sean O’Malley. Embora tivesse sido o segundo mais votado no conclave que elegeu Bento XVI, em 2005, os analistas acreditavam que a idade, 76 anos, pesava contra o argentino, além do fato de um jesuíta jamais ter chegado ao Trono de São Pedro.

O “La Stampa” lembra que, além da boa votação em 2005, Bergoglio atraiu a simpatia de um bom número de cardeais por sua fama de austero na condução da igreja argentina. Bento XVI, diz o jornal, nunca escondeu seu apreço pelo jesuíta. Já o analista Vittorio Messori, do “Corriere della Sera”, avalia que a ascendência italiana do novo Papa, que é filho de imigrantes napolitanos, e seu bom trânsito em Roma pesaram entre os europeus. Na visão deles, o agora Papa Francisco vai inflamar o rebanho em casa e ter a austeridade para enfrentar as crises que assolam a igreja.

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